CIA AVALON

quinta-feira, 15 de outubro de 2020

Desdém


Um desdém brota de meu peito como uma fenda que sangra, por onde passa destilo essa dor, num eterno lamento, em uma confusão que ainda demoro a digerir.

O amor é um sopro de um desejo que incendeia o corpo e enlouquece o querer, almejar um ser humano como um doce, uma satisfação para o ego.

É egoísmo desejar algo como quem deseja água para matar a sede, é insano o desejo aguado, reprisado, ressequido, preterido, indesejado, amaldiçoado, ridicularizado, jocoso, desdenhoso, é puro desequilíbrio, mas é.

Tem sentimentos que não temos como mensurar, como medir em uma métrica o farfalhar de um coração apaixonado ?

Como perdoar o que nos foi tirado como mulher ?

Como perdoar o desdém e o sarcasmo que um homem direciona ao querer de uma alma feminina ?

Como perdoar?

Como deixar que o tempo cure se a ferida se abre a cada dia como uma chaga pulsando sangue, pus e dor ?

O cérebro racional diz: eu perdoou, mas o corpo diz: não, eu não perdoou, meu corpo sentiu, meu coração acelerou, minha boca ressecada ficou, meus hormônios acordaram, minha pupila dilatou, todos as sinapses do meu corpo, mas as dicotomias de dentro de minha psiquê se revoltaram em uma corrida contra o tempo, uma louca e desenfreada busca por um sorriso, um respeito, um aceno, um pedido de desculpas, mas não.

A capa de bondade para mim é puro teatro, a aura de humildade, de doçura, de superioridade intelectual, de supremacia entre os jocosos movimentos da realidade me mostram a real: um simples cifrão e a nota seria outra.

E eu? Vou somando em meu caldeirão, fervendo minha mágoa, minha dor de cotovelo, minha insanidade, minha imaturidade e aceno para a minha incapacidade de lidar com meus próprios medos, minhas inseguranças que vão crescendo com o passar do tempo.

Descascando minhas neuras, minhas incertezas e meus mais pesados sentimentos, o ato de dizer me consola e minha pena vai tecendo um bordado de dor, de sofrimento e de traumas.

Cansada de dizer e não ser ouvida, cansada de amar e não ser correspondida, a idade vai trazendo a maturidade de um corpo que chora, que lamenta e que canta.

Enquanto o tempo vai maturando minhas dores, o sal vai lambendo minha pele, minhas células, minha alma.

E assim sigo.

Autora: Priscila de Fátima Jerônimo